terça-feira, 21 de agosto de 2012

O Atrator Estranho




Muitos afirmam que as condições meteorológicas da terra poderiam estar num ‘atrator estranho’. E. Lorenz anexou, em seu artigo de 1963 sobre o caos determinista, o “Deterministic Dynamical Systems”, um desenho com apenas duas curvas à direita, uma dentro da outra, e cinco à esquerda: um ponto movimentando-se ao longo dessa trajetória no espaço de fase, em torno desses sete loops, ilustrava a rotação lenta e caótica de um fluido, modelado pelas três equações de Lorenz para a convecção. Esse ‘atrator’ ficava num espaço de fase tridimensional, afinal esse sistema tinha três variáveis independentes. Assim, Lorenz pode ver uma espécie de espiral dupla, como um par de asas de borboleta, interligado com infinita habilidade. Esses loops e espirais eram infinitamente profundos, nunca se juntando totalmente nem se cruzando, entretanto permaneciam dentro de um espaço finito, confinado por uma caixa. Quando o calor crescente do sistema empurrava o fluido numa direção, a trajetória permanecia ao lado direito, mas, quando o movimento rotativo parava e se invertia, a trajetória oscilava para a outra asa. Enfim, o atrator era estável, de baixa dimensão e não-periódico.

O atrator estranho vive no espaço de fases, uma das invenções mais relevantes da ciência moderna. Traçada no espaço de fases (ou das variáveis), a sequência dos valores assumidos por essas variáveis define uma trajetória que se enrola sobre um curioso objeto de dois lóbulos. Esse objeto, que tem um volume nulo não é uma mera superfície, mas uma infinidade de falhas (muito juntas uma das outras): estava descoberto o primeiro ‘atrator estranho’, como em “Dos Ritmos ao Caos”, de Pierre Bergé, Monique Dubois-Gance e Yves Pomeau. No espaço de fase o conhecimento total sobre um ‘sistema dinâmico’ – Ilya Prigogine em “O Fim das Certezas” definiu os sistemas dinâmicos estáveis (pequenas modificações das condições iniciais produzem pequenos efeitos) dos instáveis (modificações se amplificam ao longo do tempo) – num instante único do tempo resume-se a um ponto. Esse ponto é o ‘sistema dinâmico’ – naquele instante, porém, no instante seguinte o sistema terá se modificado, mesmo que seja levemente e assim o ponto se mexe. O histórico do tempo do sistema pode ser registrado num gráfico pelo ponto móvel, traçando-se sua órbita pelo espaço de fase com a passagem do tempo. Pode-se imaginar, conforme J. Gleick em “Caos”, um ‘atrator estranho’ dando voltas e zumbindo ante seus olhos, com órbitas que vão para cima e para baixo, para a esquerda e para a direita, para frente e para trás. Como o sistema nunca se repete exatamente, a trajetória nunca se cruza, em lugar disso, faz loops circulares.

Três equações, com três variáveis, descreviam totalmente o movimento desse sistema. O computador de Lorenz imprimiu os valores instáveis das três variáveis: 0-10-0; 4-12-0; 9-20-0; 16-36-2; 30-66-7; 54-115-24; 93-192-74. Os três números subiam e desciam enquanto intervalos imaginários de tempo passavam, cinco intervalos, cem, mil intervalos. Lorenz usou cada grupo de três números como coordenadas para especificar a localização de um ponto no espaço tridimensional: a sequência de números produziu uma sequência de pontos que traçavam uma linha contínua de pontos que traçavam uma linha contínua, um registro do comportamento do sistema. O ‘mapa’ mostrou uma espécie de complexidade infinita, ou seja, ficava sempre dentro de certos limites, nunca saindo da página, mas nunca se repetindo: traçava uma forma estranha, uma espécie de espiral dupla em três dimensões, como uma borboleta com as duas asas. A forma assinalava a desordem pura, já que nenhum ponto ou padrão de pontos jamais se repetir, não obstante também assinalava um novo tipo de ordem. A misteriosa curva traçada ao final, a dupla espiral que se tornou conhecida como ‘atrator de Lorenz’.

Os atratores dos regimes estacionários (ponto fixo) e periódico (ciclo limite) são tais que as trajetórias neles convergem de maneira monótona Como as trajetórias oriundas de diferentes pontos do espaço das fases ali convergem? Primeiramente, essas trajetórias estão submetidas a vínculos à primeira vista contraditórios. Ao considerar a existência do caos indiscernível, a própria ‘sensibilidade às condições iniciais’ implica uma divergência de trajetórias vizinhas, divergência que lhes confere evoluções independentes, não-correlatas, dessemelhantes. Como o sistema é dissipativo, entretanto, todas as trajetórias devem convergir para o ‘atrator’ que se busca compreender. Para conciliar essas duas exigências contraditórias: a divergência deve se realizar numa direção do espaço das fases e a convergência numa outra.

Apreende-se da geometria do atrator a evolução de um conjunto de condições iniciais (posição, velocidades) situadas no interior de um retângulo, por exemplo, no caso do pêndulo simples oscilante e de seu atrator ciclo limite: o retângulo contrai-se pari passu com a evolução até tornar-se um segmento – um arco de elipse. No espaço das fases, tridimensional, a trajetória será errática, mas recordará do ciclo limite ‘fantasma’: errando de maneira até complexa, mas na vizinhança desse ciclo limite, a trajetória continuará, em média, funcionar.

Considere-se, no caso do atrator do regime periódico, um conjunto de condições iniciais situadas num retângulo do espaço das fases. A convergência para o atrator (devida à dissipação que acarreta uma contração da área) e divergência das trajetórias (SCI) devem agora coexistir. O retângulo vai ser esticado numa direção (SCI) e achatado (contração) na outra. O necessário alongamento do retângulo não pode se realizar sem que haja um dobramento simultaneamente para continuar ainda nesse volume limitado. Com isso, ao final de uma volta, o retângulo ter-se-á transformado numa ferradura. Com a tríplice operação de alongamento (dobramento e contração contínua) a se realizar, na segunda volta, essa ferradura será o corte de um objeto complexo: o atrator caótico, constituído de uma infinidade de folhas. Trajetórias sob uma série de alongamentos e de dobramentos sucessivos que produzem uma evolução em ferradura sob uma contração permanente.

Deduz-se, pois, o princípio de formação de um ‘atrator estranho’: [a] os pontos iniciais estão contidos num retângulo qualquer, por exemplo, ABCD. Durante a evolução, essa superfície que contém os pontos é alongada, dobrada, realongada e redobrada até formar um conjunto folheado muito complexo; [b] primeiras etapas da evolução do retângulo cujo corte é representado à direita. Manifestam-se semelhantes etapas de construção de um conjunto de Cantor.

Nos procedimentos da ‘poeira de Cantor’ não se precisa dispor de uma série de pontos equidistantes ao longo dos objetos, os pontos a enumerar são os que constituem a própria ‘poeira’ objeto ao longo do método de fabricação do objeto. Diante de uma infinidade de pontos, a ‘dimensão D’ não será nula, mas a presença de ‘buracos’ no objeto fará que o número de pontos contidos nas esferas de contagem aumente menos rapidamente do que no caso da reta que, por seu lado, não tem buracos. A dimensão da poeira de Cantor está compreendida entre 0 e 1. ‘Flocos de Neve’: estranho objeto que não é uma superfície nem tampouco uma linha, tem um perímetro infinito; não se recorta e se mantém numa espaço limitado.




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